Grandes Sinistros

Subdividiremos os socorros adiante descritos, em três rubricas: extinção de incêndios, socorros a náufragos e acidentes:

Incêndio no Palácio Nacional de Queluz (1934.OUT.05)

“Confrangia ver, de longe, o aspecto do palácio a arder, Todo o corpo central do edifício era uma fogueira imensa, de onde alterosas chamas se elevavam ameaçadoras e terríveis. A alguns quilómetros de distância, distinguia-se bem o braseiro enorme, as labaredas alterosas que pareciam atingir o céu. Era, a um tempo, belo e trágico o espectáculo impressionante do fogo a devorar inclemente e impiedoso tanta riqueza e tanta arte amontoada durante dois séculos de Historia”.

Este, segundo o elucidativo relato da época, do “Diário de Notícias” o cenário do pavoroso incêndio que devorou o Palácio Nacional de Queluz. É ainda do mesmo jornal a afirmação de que “no incêndio…uma das corporações que prestaram serviço foi a dos Voluntários de Paço de Arcos, que sob a direcção dos srs. Vieira Ramos e Carlos Raposo, 1º e 2º comandantes, e do ajudante sr. Joaquim Pereira dos Santos, ali compareceu na sua máxima força, com os seus carros de pronto-socorro, tendo tomado parte no ataque, com os bombeiros Municipais de Lisboa, em um dos ângulos do edifício. Esta corporação, tendo comparecido à 1 hora, só retirou às 9 horas, tendo voltado para Queluz às 13 horas do dia 5, a requisição do sr. governador civil, para trabalhar no rescaldo, e ali prestou serviços até às 19 horas. Nos trabalhos de rescaldo, um dos Voluntários desta corporação, sr. Francisco Raposo, encontrou dois pequenos cofres com joias que foram entregues pelo respectivo comandante ao sr. administrador do concelho de Sintra”.

Meio século depois, Queluz, numa organização conjunta dos seus bombeiros e da conservadora do seu palácio, quis conceder uma medalha alusiva à tragédia, a cada um dos 41 sobreviventes em 1984, dos 372 soldados da paz, de catorze corporações que tinham combatido o sinistro. Por Paço de Arcos, ali estiveram, desfiando recordações, quatro bombeiros da Corporação: Comandante Jorge Augusto Gabriel e Subchefes João Correia João Ribeiro Silvério e Francisco Pedrosa Rebelo.

Náufragio do Santa Mafalda (1966.JAN.22)

“Pelas onze horas e cinquenta minutos do dia vinte e dois de Janeiro do corrente ano foi recebido nesta Associação um telefonema da Torre de S. Julião da Barra, informando que o barco de pesca Santa Mafalda A971-N encalhara em frente ao referido Forte. Dado o alarme todo o pessoal disponível compareceu seguindo sem perda de tempo para o local do sinistro, transportando-se no auto porta-cabos, nos Jeeps nºs 1 e 2 e nas ambulâncias nºs 2 e 3.

Chegados ao local e verificada a grave situação do barco, foi estabelecido o serviço lançando-se um foguete de 300m. o qual atingiu o alvo. Montado o cabo singelo e o de vai-e-vem, procedeu-se ao salvamento do pessoal que se encontrava a bordo. Foram retirados trinta e um tripulantes e um cão.

Todo o serviço desde a chegada ao local até ao último elemento salvo decorreu em uma hora e cinco minutos.

… Todos os tripulantes foram conduzidos nas ambulâncias desta Corporação e nas dos voluntários de Oeiras, à Estação do Instituto de Socorros a Náufragos em Paço de Arcos, onde os assistiu voluntariamente o Exmo. Sr. Dr. César Abel, residente em Oeiras e o Exmo. Sr. Dr. Trindade Brás, Vice Presidente desta Associação”

O Barco Santa Mafalda, estava avaliado em cerca de 40.000 contos, saíra do cais do Poço do Bispo, com 13 tripulantes e 68 pescadores, rumo aos bancos bacalhoeiros da Terra Nova. Ao passar junto a São Julião da Barra, uma avaria no leme fê-lo guinar para estibordo e encalhar nos rochedos. Os pilotos da barra recolheram 41 homens e os restantes foram salvos pelas corporações de bombeiros de Paço de Arcos, Cascais e Oeiras.

No dia seguinte, as parangonas no “Diário de Notícias”, diziam:

“Naufrágio na Barra de Lisboa
O desespero do Homem
e a Indiferença do Mar
Rasgado pelas rochas de São Julião
o Santa Mafalda acaba à vista do Oceano”

Acidente Ferroviário na Gibalta-Caxias (1952.MAR.31)

“Uma avalanche de terra desabou sobre um comboio da linha do Estoril – um desastre horrível, dos mais graves ocorridos em caminhos de ferro portugueses, pelas condições em que se verificou.

O comboio, que saiu pouco depois das 11 horas, de Cascais, com destino ao Cais do Sodré, era constituído por uma carruagem motora, mista, de 1ª e 2ª classes, pelo furgão e por mais duas carruagens de 3ª classe. Parou em todas as estações até Caxias, de onde partiu às 11 e 29 à tabela. Um minuto depois deu-se a tragédia.

Quando o comboio passava junto ao morro da Gibalta, em cujo cimo, conhecido pelo Alto da Boa Viagem, passa a estrada marginal e está colocado o farol da Gibalta, a barreira de terra, que constitui o morro, numa extensão de cerca de trinta metros e numa altura de sessenta, despenhou-se com enorme fragor, sobre o comboio. Algumas pedras atingiram o furgão mas onde a avalanche caiu na sua maior força foi sobre a terceira carruagem, destruindo-a por completo, esmagando-a e a muitos dos seus passageiros.

Mais de trinta bombeiros, sobre os destroços da carruagem, fustigados pela chuva e pelo vento, estoicamente procuravam remover a terra e as pedras, algumas das quais, pelo seu tamanho e peso, não podiam ser arredadas por forças humanas. Alheios ao perigo em que estavam, aqueles homens tentavam o impossível, correndo o risco de ficarem também esmagados, pois outra grande parte do morro, no qual se viam grandes pedregulhos e em cujo cimo está o bloco de cantaria do farol, com mais de uma dezena de metros de altura, podia ruir de um momento para o outro.

E era nestas trágicas condições que os bombeiros tentavam tirar da carruagem os feridos e os mortos. Trabalho sobre-humano, difícil, senão impossível. Mas, na ânsia de socorrer quem sofria, não olhavam ao perigo que corriam.”

Este o cenário dantesco daquela manhã de 31 de Março de 1952, a justificar o cabeçalho da primeira página do “Diário Popular”:

“Junto ao farol da Gibalta, perto de Caxias toneladas de terra e pedras numa avalanche
gigantesca cairam sobre um comboio,
10 mortos e 38 feridos numa carruagem esmagada.
Receia-se que outros passageiros estejam ainda sob os escombros”

in “Os Bombeiros de Paço de Arcos – 1893/1993” de Rogério de Oliveira Gonçalves

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